sábado, 5 de dezembro de 2009

003_Enfermaria 204_ Atendimento Público

Atendimento público

Meu amigo, médico de hospital público, Dr Raphael, entra no circuito e liga dizendo que o hospital de referência para isso é o Hospital Municipal Miguel Couto.

Para meu desespero imaginei o pior quadro possível. E, de certa forma, era! Luciene e Raphael me pegaram em casa fui para o Miguel Couto.

Fiz a ficha rapidamente. Raphael, cara de novo, tentou entrar comigo, mas o segurança, com a maior autoridade possível barrou, pois “aqui não entra ninguém. Nem sendo médico”. Mostra carteira. O segurança entendeu que ele era realmente médico, que ele trabalhava num outro hospital municipal, mas daí deixá-lo entrar era outra história “por mim não entra mesmo”, sentenciava ele. Com uma paciência franciscana Raphael argumentava, quando já de saco cheio eu peguei o celular. Quando o segurança ouviu a palavra “direção do hospital”, imediatamente mudou e disse “pode passar e, por favor, nem precisa incomodar a direção afinal temos ordem de deixar médicos passar por aqui sem problemas”. Ou seja, era só crise de autoridade, mesmo!

O médico chama, olha a radiografia, manda tirar outra no segundo andar e voltar depois. Esse era o Alexandre Calixto. Fiz a radiografia! Eu era o décimo quarto na fila de espera. Retornei. Além dos que estavam com radiografia, existiam pelo menos mais outro dez na fila. Um menino que teria que amputar a mão em função de “fogos de artifício” que explodiram. Outro com problemas nos ombros e braços necessitando cirurgia! Raphael calado não se apresentara como médico, mas meu acompanhante.

Minha surpresa foi ver aquele jovem médico de 25 anos ou um pouco mais, ali, cansado, mas atento. Era uma espécie de guerra secreta. Uma batalha invisível, silenciosa. Com seus olhos verdes, Dr Calixto fixava sua plena atenção na radiografia. Comparava uma e outra e estava disposto a não se deixar vencer por aquela fratura. Apresentou a radiografia aos outros dois médicos, Thiago e Gustavo, ele orientava os mais novos, discutiam, olhavam e discutiam. Outra radiografia. Puxa aqui, estica ali, grito aqui, grito ali. Sobe ao poli-trauma, conversa com os membros do “staff”.
Sentencia que vai fazer a redução da fratura. Explica detalhadamente o que vai fazer. Juntam os 3 médicos e uma enfermeira, cada um pega numa parte do braço, da mão, do pulso e dos dedos! Puxam e esticam.
Vocês podem não acreditar, mas como sou muito homem, gritei como um machão e o máximo que pude! Foram três tentativas de redução da fratura, três gritos bem altos!
Coloca gesso, nova radiografia, uma conversa muito esclarecedora, todas as dúvidas dirimidas. Volte semana que vem!
Volto pra casa com uma visão muito diferente! Há uma paixão, uma vontade de atender, de um ser humano, que é medico, atendendo outro ser humano que é paciente. Não era cifrão ou estatística. Era serviço púbico de qualidade e humanizado!

Durante todo o tempo em que estive naquele banquinho de espera eu via que aqueles três médicos residentes não paravam.

Apesar de todas as “notícias de jornal e de TV ” era o mesmo atendimento dedicado para bêbados, brigões, crianças, idosos, homens ou mulheres!

Foi assim nas três vezes que eu fui lá!

Minha admiração crescia por esses médicos que estavam trabalhando antes da minha entrada, já cansados, mas continuarão depois que eu partir.

Humanamente é incrível, mas é também humanamente impossível, conviver com aquelas condições de trabalho.

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